sábado, janeiro 25, 2014

Uma galinha de capa e batina é apenas uma galinha de capa e batina






No tempo em que fui estudante universitária da licenciatura, logo após o 25 de abril, não havia trajos académicos nem praxes nem queima das fitas. 

A ideia, perfeitamente lógica e atual, é que os estudantes universitários eram privilegiados, eram mesmo uma minoria da população, e já não vivemos em tempo de exibir privilégios.

Nos meus últimos anos de estudante, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, houve uma tentativa de, ia dizer reintrodução, mas na verdade tratava-se de introdução na Universidade do Porto, de uma alegada "tradição", que nunca lá tinha existido, importada de Coimbra.

Participei nas manifestações que se realizaram contra esta atitude: uns 30 estudantes, mascarados, ou assim nos parecia, mascarados de estudantes, a desfilar no meio de um corredor de estudantes "à paisana", ou seja, vestidos com a sua própria roupa, rica, pobre ou remediada. Houve insultos, houve mesmo quem  atirasse pedras, mas o cortejo ia protegido por brigadas da PSP. Na verdade, eram mais polícias do que estudantes da parte de dentro do cortejo. O que é significativo: foi necessária  polícia para proteger dos estudantes "tout court" os que se exibiam e gabavam de serem estudantes. E que talvez nem fossem. Não é por se ter uma capa que se é estudante. E muito menos um estudante bom.

E talvez resida aí a questão: para a mentalidade portuguesinha, andar de capa e batina, símbolo do estudante, é quanto basta, não importa se se é bom, mau, ótimo, ou Fake.

Lembro-me também de um rapaz que passeava uma galinha pela Faculdade de Letras do Porto, com um fio amarrado ao pescoço e uma capa preta por cima das asas. Nunca esqueci este detalhe, até porque foi a primeira e última vez que vi esse rapaz, tão discreto que não se reparava nele.

Esta imagem da galinha de capa preta de estudante, amarrada por um fio, a seguir um estudante que era contra a praxe, traduz bem a atual "tradição académica", tradição que nunca existiu, a não ser em Coimbra e que lá, era obsoleta, já há muito tempo.


A submissão, o seguidismo, o não resistir à humilhação, o ser reconhecido por coisa nenhuma, só pela aparência, o copiar descaradamente, ou apresentar trabalhos plagiados ou feitos por outros, ou mesmo comprados, estas são de facto caraterísticas da tradição académica portuguesa, no seu pior. E da tradição laboral portuguesa, que assim começa, de forma vergonhosa. 


Não tenho fotos do evento que narro, mas devem existir. 


Este artigo de Pacheco Pereira explica com mais detalhe as lutas, no Porto, contra o retomar da "tradição":  "A abjecção das praxes"

 

Também interessante o de Vaco Pulido Valente: Praxes: igual à máfia?"(VER AQUI)

(Muitos comentários feitos a esta última crónica por estudantes portugueses em universidades inglesas afirmam que lá não existe nada disto, antes uma integração através de eventos desportivos e culturais, relacionando o estudante com colegas dos outros cursos e integrando-os, ao mesmo tempo que se promove a  cultura.)



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