Ouvi esta conversa num transporte público em Lisboa.
- Agora ninguém quer saber dos velhos para nada! Ninguém quer os velhos em casa! Os velhos cheiram mal! Fora, velho! Antigamente não era assim!
- Pois não!
- Antigamente vivia toda a gente apinhada numa casa: pais, filhos, avós. A gente mais nova estava sempre morta que a velha morresse para lhe ficar com o quarto...
- Antigamente era assim...
E digo eu agora: bons tempos. A solidão dos velhos (e dos novos) não existia. Vivia toda a gente apinhada numa casa, os velhinhos rodeados dos netinhos: Ó velha, você nunca mais morre para eu ficar com o seu quarto! Rodeados de carinho: A velha come demais, quando você morrer sobra mais comida para cada um.
-Sua bênção, avozinha. Então, está melhorzinha?
Como dizia o nosso querido Fernando Pessoa, que viveu nesse tempo.
" Maravilhosa gente humana que vive como os cães
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita
Nenhuma arte criada
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim,
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus,
Intangíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida! "
in "Ode Triunfal", vv 171 e segs.
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