Logo pela madrugada, levanto-me da cama, saio para as ruas de Lisboa, vou ao café comer um pastel de nata e tomar um cafezinho.
- A fatura, por favor!- Aqui a tem. Não se esqueça de a guardar durante quatro anos. - Claro que não. Nunca esqueceria uma coisa dessas.Vou trabalhar. A certa altura tenho sono e dirijo-me a uma máquina de café de moedas, chamada Alice. Tiro um café.
- Alice, dá-me uma fatura, OK? Alice!!! Alice!!! Olha que eu posso ser multada! - Dou um pontapé na Alice, que fica igual a ela mesma, imóvel. A Alice não dá faturas. Falha técnica, que deve ser reparada.
A meio da manhã, aproveito uma aberta e saio um nadinha, para tirar fotocópias.
- Por favor, a fatura!- Ok. Como tirou várias fotocópias diferentes, quer várias faturas?- Sim, por favor. Três faturas. Claro.Aproveito a saída do trabalho para ir comprar o jornal. Folheio também um livro, oferta de uma revista e um DVD, oferta de outra revista e trago tudo.- Por favor, passe-me três faturas, está bem?- Com certeza. É para já. Guarde-as durante três anos, senão eu pago uma multa, está bem?- Não são quatro anos? - Ah, pois é. Quatro anos.A caminho do trabalho, revisto os bolsos e a carteira: deveria ter sete faturas, mas onde é que as meti? Só encontro duas, uma do café da manhã e outra do DVD. Se calhar deixei as outras cinco no quiosque dos jornais. Volto atrás.- Não viu aqui 5 faturas? - Eu tenho aqui uma caixa cheia delas, veja lá se algumas são suas!Olho, folheio: faturas do talho, da peixaria, do sapateiro, do amola tesouras e navalhas, do lupanar Bataclã, do tarólogo, do carpinteiro, do reparador de aparelhos elétricos, das aulas de ginástica, da Igreja Dos Últimos Tempos...- Não, obrigada, estas não são minhas!Cenas dos próximos capítulos: ainda só são dez da manhã e já perdi cinco faturas....Esta ficção baseia-se nesta notícia dos jornais de hoje
(A mim parece-me boa ideia exigir faturas, pois todos deveriam pagar impostos, ao contrário do que acontece em Portugal. Mas para que servem os registos informáticos? Para andarmos carregados de papéis e para abatermos inutilmente milhares de árvores? Por outro lado, se não for obrigatório pedir fatura é considerado antipático pedi-la. E colaborar com a fraude. E pagar mais impostos, a favor daqueles que não pagam um cêntimo. Esta coisa está a ser bem feita?)