quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Enveja

Num dos meus últimos posts, eu perguntei qual era a última palavra de "Os Lusíadas", tendo afirmado que essa palavra só pode ser muito importante no contexto.
Senão, vejamos.
Camões escreve um livro grande (em tamanho), sempre com estrofes de oito versos, cada verso com 10 sílabas métricas. Cada estrofe está dividida em termos de ideia. Os quatro primeiros versos dizem uma coisa, os quatro restantes dizema outra. Mas isto não é tudo.
O esquema rimático de cada estrofe ou estância é sempre o mesmo: ABABCBDD.
Mais ainda: cada verso é acentuado na 6ª e 10ª sílabas (ritmo heróico), a não ser quando o poeta fala de amores, usando, então, o ritmo sáfico (acentuação nas 4ª, 8ª e 10º sílabas).
Complicado? Então vejamos: a última palavra de todo o livro é (como disse em comentário a Inteb, que faz anos domingo (parabéns Inteb)):
a última palavra de todo o livro é "enveja"
A resposta fácil e simples é: Camões não reparou nisso. Acham? Reparou em tudo e não reparou na última frase que escreveu, a mais importante de todas as frases de um livro?


Não me parece.
Antes parece que num país em que os que têm talento são marginalizados como Camões e os que não valem nada e são vigaristas bacocos e altamente valorizados, até porque têm cargos de poder, é natural que a inveja seja o principal sentimento social.
Os grandes escritores têm inveja dos escritores comerciais porque são estes que estão na onda e que ganham dinheiro, os escritores comerciais têm inveja dos bons porque sabem que são medíocres e que nunca serão como eles, os políticos e demais mercantes sabem que são medíocres e morrem de inveja daqueles que "por obras valerosas se vão da lei da morte libertando", etc.


Oiçamos o grande tio Luís (de Camões), num dos últimos versos da sua obra, profundamente decepcionado com Portugal e com os portugueses:


"Não mais,Musa,não mais,que a lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor que mais se acende o engenho
Não no dá a Pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
De uma austera, apagada e vil tristeza"


Será que Camões se referia ao momento presente?
"Austera, apagada e vil tristeza?"
Esta tristeza do Freeport é apagada e vil, acho eu... e a da Universidade Independente, que, alegadamente, ocultava crimes de branqueamento e outros, é apagada e vil, acho eu. E a do BPP, que, alegadamente, também ocultava crimes de branqueamento e outros, é "é apagada e vil", acho eu.
E a criatura que vem sempre a própósito destas apagadas e vis tristezas:
Será Dom Sebastião?


Vou colocar este post a comentar esta notícia do jornal Público
Sócrates sairá com imagem reforçada depois de esclarecido o caso Freeport, acreditam militantes

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