quarta-feira, maio 31, 2006

Contos populares: O Ancinho

Os ditados e contos populares são às vezes comicamente antiquados: “O que não mata engorda” – quem se guia agora por semelhante ideia?
Esta história foi-me contada quando eu vivia numa pequena terra onde nasci.


Uma rapariga da aldeia, filha de camponeses pobres, foi servir para o Porto. (Noutras versões poderá ter casado com um homem do Porto, o que seria um pouco estranho).
Um dia, quando voltou a casa, vinha de tal modo chiquérrima que já não se lembrava de nada e era preciso explicar-lhe tudo:
- Ó meu pai? O que é aquela coisa ali deitada no chão e cheia de picos????!
(Cá entre nós era um ancinho, uma coisa com picos que serve para apanhar as folhas que caem das árvores).
- Ai tu não sabes o que é aquilo?
- Não, meu pai. (A rapariga até era bem educada).
- Então põe o pé em cima dos picos.
A rapariga assim fez, mas, ao fazê-lo, o cabo do ancinho levantou-se e bateu-lhe no nariz. Ao sentir aquela sensação, muito desagradável mas muito familiar, a rapariga lembrou-se logo e disse assim:
- Ah, meu pai, é um inchinho! (corruptela de lá).


Moral da história:1º- Nunca devemos fingir-nos de chiquérrimos e fingir que não sabemos o que é um inchinho. 2ª- Não devemos esquecer / renegar as nossas raízes! 3ª- Convém sabermos onde pomos os pés.
Falta de moral da história: este conto foi-me narrado de forma interactiva: eu fingia que era a rapariga e punha o pé nos picos, para nunca mais me esquecer da sensação, realmente inolvidável (parece que foi ontem). Mas só o pus da primeira vez, porque eu não sou burra!
Ora, da última vez que experimentei, com muito cuidado, o cabo não me bateu no nariz, mas sim nas pernas, talvez nas ancas, no máximo. Daqui se conclui que a rapariga era criança. Quantas histórias e quantos ditados haverá, relativos ao trabalho infantil e outras coisas deste género?
“O trabalho do menino é pouco, mas quem o não aproveita é louco”.

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(Contos narrados pelo meu avô Manuel Daniel de Sousa, transcritos após a sua morte, com contribuições de várias pessoas da família. O avô contava estas historias milhares de vezes, enquanto os primos piscavam os olhos entre si, sentados em escabelos, na espreguiçadeira, ou deitados na carqueija, a ser queimada na lareira.)

3 comentários:

Jubi disse...

Engraçadíssimo e igualmente interessante...!

Motto motto motto contos e ditos populares, onegai o shimasu!

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

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