quarta-feira, junho 17, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento: quebrar estátuas






A primeira vez que vi a estátua do Padre António Vieira foi na notícia de que tinha sido vandalizada, pouco depois de ter sido inaugurada (em 2017), já na altura pelo mesmo motivo.
Fiquei chocada ao vê-la, como depois quando a vi em presença.
Quem é que tem o mau gosto de fazer uma escultura de homenagem, representando um padre com crianças nuas, nesta altura em que tanto se fala da pedofilia de padres católicos? 
Como é que se escolhem os artistas e que liberdade é esta de fazerem o que lhes dá na bolha? O artista não se lembrou disso? Ou teve alguma intenção esquisita? Estará a gozar connosco? Não dá vontade de a deitar abaixo?
Isto, para nem mencionar a mensagem arrogante da grande superioridade católica sobre a cultura dos índios, aqui infantilizados, estando os índios simbolizados por crianças e nós, portugueses, por um ser muito superior.

Vieira realizou muitos projetos, trabalhou intensamente e viveu muito tempo, não apenas como missionário nos confins do Brasil de então, mas também na política portuguesa, como embaixador de Portugal na Holanda, para negociar a parte do Brasil que os Holandeses tinham conquistado a Portugal durante a ocupação espanhola. 
Nessas época, torna-se confessor da rainha Cristina da Suécia, em Roma e dizem mesmo que houve uma paixão amorosa entre eles.
Houvesse ou não, Vieira recusou essa vida "regalada" e voltou para Portugal, regressando mais tarde para o meio dos índios.
Em Roma, tinha sido muito apreciado como intelectual, como pensador, como escritor e poderia nunca de lá ter saído.
Talvez o escultor para uma estátua de Vieira devesse ser alguém com experiência de vida. E com juízo.


P.S.: Quando está tudo metido em casa, não é difícil quebrar estátuas...

(Imagens retiradas da Internet)

Diário da quarentena e do desconfinamento: As máscaras e a Santa Inquisição



A nossa sociedade, que teve a Inquisição durante séculos, ainda tem um pendor muito inquisitorial, sobretudo em Lisboa. Foi a primeira impressão negativa que tive quando vim para cá, há muito tempo, é a impressão que continuo a ter.
Isto nota-se muito agora, desde que, a partir de um determinado dia, se tornou obrigatório o uso de máscara. A partir do minuto zero desse dia, cai tudo em cima de quem não tem máscara, ou a esqueceu, ou a tem colocada abaixo do nariz...
Isto não vai desaparecer em breve, porque as pessoas adoram controlar-se umas às outras. 

Até agora, não tinham pretexto, agora têm.

Por outro lado, quando, em Lisboa, vemos uma muçulmana de rosto tapado (aliás, não vemos, as pessoas de outras culturas não se atrevem  usar aqui os seus trajos, ainda bem no caso das muçulmanas) logo receamos as consequências de alguém andar na cidade de rosto tapado e de identidade desconhecida. 
Mas tudo muda quando o problema nada tem a ver com diferentes culturas, claro.

terça-feira, junho 09, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento: continuem a espalhar o terror, please!




Agora, que muitas pessoas passam horas frente  o televisor a ver e ouvir notícias de terror sobre o coronavírus, surge também uma curiosa notícia: no rio Douro, em Espanha, está um crocodilo do Nilo, perigosíssimo e pesando 250 Kgs. Enorme!!!!
Querem ir para as praias fluviais? Olhem que o crocodilo rapidamente vem de Espanha para Portugal! 
Lá fora, fora de casa, é um lugar perigoso.
Embora os jornalistas, os jornais, as televisões, as rádios onde trabalham adorem veicular estas notícias, há sempre um basta!
"Basta Pum! Basta!" - no dizer de Almada Negreiros.
Então, parece que afinal, em vez do crocodilo horrendo, era só uma lontrinha querida. Com um peso  que oscila entre os 8 e os 18 Kgs... e com um arzinho doce... 
Só têm uma coisa em comum: o homem tira-lhes pele, para a usar.

Continuem a espalhar o terror, please! We love that!!!!
(Fotos retiradas da Internet) 

Diário da quarentena e do desconfinamento: alguém espera ficar cá para sempre?



Existe a ideia de fazer um passaporte para quem já teve o Covid 19, ou para quem passou num teste de imunidade. essas pessoas poderiam ir a todo o lado, mesmo em caso de nova quarentena.
Vem logo alguém dizer que nada disso conta, quem já teve pode voltar a ter, etc…
A OMS afirma que os assintomáticos não constituem perigo, pois não contagiam, vem logo uma criatura, médico, investigador, jornalista dizer que os assintomáticos são perigosíssimos. 
Alguém aguenta isto? 
A culpa é dos confinados por vocação, que dão ouvidos a esta gente e que permitem todo o tipo de lavagem ao cérebro. A eles e a todos.
Vamos tentar vivera nossa vida sem o terror das doenças? 
Todos podemos morrer. De susto, de medo, de tédio, de gripe, de coronavirus, de acidente, afogados na praia, de terramoto com o telhado em cima da cabeça…
Alguém espera ficar cá para sempre? Não? 

Então, coragem!

domingo, junho 07, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento: a eficácia que se avaria

Fúrias

Escorraçadas do pecado e do sagrado 
Habitam agora a mais íntima humildade 
Do quotidiano. São 
Torneira que se estraga atraso de autocarro 
Sopa que transborda na panela 
Caneta que se perde aspirador que não aspira 
Táxi que não há recibo estraviado 
Empurrão cotovelada espera 
Burocrático desvario 

Sem clamor sem olhar 
Sem cabelos eriçados de serpentes 
Com as meticulosas mãos do dia-a-dia 
Elas nos desfiam 

Elas são a peculiar maravilha do mundo moderno 
Sem rosto e sem máscara 
Sem nome e sem sopro 
São as hidras de mil cabeças da eficácia que se avaria

Já não perseguem sacrílegos e parricidas 
Preferem vítimas inocentes 
Que de forma nenhuma as provocaram 
Por elas o dia perde seus longos planos lisos 
Seu sumo de fruta 
Sua fragrância de flor 
Seu marinho alvoroço 
E o tempo é transformado 
Em tarefa e pressa 

A contratempo. 

Sophia de Mello Breyner

domingo, maio 31, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento: E assim chega ao fim o mês de maio, sem glória




Maio cai hoje de maduro. "Maio, Maduro Maio"...

Tendo tido, este ano, muito confinamento e poucas cerejas.
Desejo-vos, desejo-nos um junho mais feliz!

Diário da quarentena e do desconfinamento: os escravos e o donos de escravos

O ensino está a criar uma elite e os escravos para essa elite. É por isso que os melhores deixam copiar os piores e lhes fazem sozinhos os trabalhos de grupo. Sabem o que estão a fazer. São como os antigos esclavagistas que engravidavam as escravas para aumentarem a mão-de-obra. Os pais dos melhores colaboram com eles e os dos piores também colaboram com os piores, ajudando a transformá-los em pequenos vigaristas. Não confundir com grandes vigaristas, porque para isso é preciso ser bom.
Antigamente os escravos não sabiam ler, agora têm o mestrado, que fazem com trabalhos emprestados ou comprados.
Isto nota-se melhor com o Ensino à Distância.
É claro que alguns da elite serão escravos nesta sociedade de tios e tias, mas podem sempre emigrar.

quinta-feira, maio 28, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento: Um Jardim Zoológico a ver outro Jardim Zoológico

Um tal Soá foi expulso do Big Brother e parece que isso é algo de muito importante, estou farta de ler este nome sem antes saber quem era e até o diretor de programas faz declaracoes muito sérias . 

Que mundo paralelo é este? As pessoas estao trancadas em casa a ver pessoas trancadas em casa? 
Um Jardim Zoológico a ver outro Jardim Zoológico?

terça-feira, maio 26, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento

Só há pouco tempo inventaram andar de máscara, mas já causa inúmeros problemas que estão para durar. 
Já no dia seguinte àquele em que foi obrigatório o seu uso em certos locais, em todo o lado se ouviam gritos histéricos: ponha a máscara, não tire a máscara. 
Como o governo não vai decidir que a certa altura já não é necessário usar tal coisa, vamos ter que alombar com a máscara para sempre.

Algumas pessoas adoram mandar...

Diário da quarentena e do desconfinamento: ensino a distância

Aula virtual síncrona: 
Professora: - Manuel, você disse que fez o trabalho, mas quando lhe peço para ler uma qualquer resposta, não lê, por isso vou considerar que não fez. E se não deixa imediatamente de filmar a aula com o telemóvel, marco-lhe falta disciplinar e excluo-o da aula.
Manuel: - A setôra está sempre a embirrar comigo. Ai há faltas disciplinares nestas aulas?!
Pai do Manuel: - Quem é essa professora que está a mandar vir contigo? 
Manuel: - É fulana de tal!
Pai do Manuel: - É professora de quê?
Manuel: - De português!
Rita: - É a tal!
Risos de toda a turma

Cenas dos próximos capítulos... Outra turma... Alunos mais velhos...

(Vozes muito iradas, já para lá de um ataque de nervos)
- E tu cala- te, ouvistes?
- Cala-te tu. Cala-te tu! Estou farta!
Tomás: - Ó pá, desliguem o som! Nós também temos pais! Não são só vocês! Farto disto tudo, que horror! Não se aguenta!
(Todos desligam o som).

segunda-feira, maio 04, 2020

Diário da quarentena e do desconfinamento



Diz-me a cabeleireira, a quem tinha dito que não tenho medo nenhum dp coronavírus:
- Nem eu. Sabe, eu estive sempre a trabalhar. As clientes iam a minha casa.
Diz a empregada de limpeza que a máscara que traz (cirúrgica), lhe foi oferecida há um mês por uma "senhora" e desinfeta-a todos os dias, assim como faz com as luvas (descartáveis)...
"Cá se vai andando / com a cabeça entre as orelhas ".

sexta-feira, maio 01, 2020

Muguet para os leitores do blogue, no 1º de Maio






O muguet, que dai parte da tradição do primeiro de maio em França, também fazia parte dos rituais de adoração da deusa Flora entre os romanos. também conhecido como lírio do vale, parece não existir em Portugal, ou ser pouco conhecido entre nós. 
É tradição francesa enviar um raminho aos amigos. Aqui está.
Feliz 1º de maio para vocês!

sexta-feira, abril 24, 2020

25 de abril: Não Percas A Rosa!



Noite de 24 para 25 de abril. Passei varias destas noites no Botequim da Natália Correia a cantar até enrouquecer, as canções de abril. Adoro cantar e canto bem.
Parece-me bem que se comemore esta data, mas sempre como festa. 
Viva o 25 de abril, a revolução dos cravos!
Ou, como disse a Natália no título de um seu livro: "Não Percas A Rosa!".

Trump e as injecções de lixívia

O Trump recomenda injeções de lixívia. Acho bem. Para ele e para os que votaram nele.

quinta-feira, abril 23, 2020

Dia Mundial do Livro

Neste Dia Mundial do Livro, vamos expor alguns livros de que gostamos. Não aqueles de que gostamos mais, pois esse ficam para outra ocasião. 

Aqui vão alguns dos meus livros preferidos, com legendas.





Ao fazer esta seleção, descubro que, algures no tempo, uma qualquer empregada de limpeza decidiu arrumar os meus livros por tamanhos. Ou talvez por cores. Teve razão. Os ebooks não ocupam espaço material e ficam logo por ordem. 
Apetece-me imenso fazer uma fogueira com todos os meus livros e virar limpadora obsessiva compulsiva.
Até lá... A seleção possível, pois não sei dos outros. Lol.





Mais cinco livros de que gosto.
Dois deles, ou talvez todos, por razões que são óbvias.

sexta-feira, abril 17, 2020

Professores alunos, tudo ao natural em "Txitxas Life"






Acho este site engraçadíssimo, alguns alunos tratam a professora de inglês como teacher, Às vezes com má pronuncia do Inglês, portanto, este site chama-se Txitxas Life.
Os próximos tempos vão trazer matéria risível aos molhos para esta txitxa, que está em casa, sozinha e feliz com os gatos, ao contrário dos alunos, pais, mães, etc. que estão na maior bagunça , digamos, na real life.
Os alunos têm nomes improváveis, mas parecidos com os nomes reais.
Esta banda desenhada é um misto de "Criada Malcriada" (com desenhos muito mal feitos mas engraçados por isso mesmo) e de outros programas humorísticos, como os de Hermano José, mas mais ingénua.
O Arlindo Ricardo ou o Arnaldo Sérgio não são propriamente criaturas ridículas por se chamarem assim,  por pertencerem a um determinado nível sócio-económico como nos programas do Hermano José, são miúdos a quem puseram este nome por qualquer razão. Que culpa tem alguém do nome que lhe foi posto e que tem de ostentar toda a vida, com sentidos e significados diferentes de década para década

terça-feira, abril 14, 2020

Religião católica e contágio






O porta-paz ou Pax, que substituiu o beijo na missa da Idade Média, deixou de ser usado por razões higiênicas e voltou a ser substituído, mais tarde já no século XX pelo beijo entre as pessoas.
Era uma placa com imagens sagradas, podia ser muito simples ou podia ser uma jóia, com uma pega por trás, dada a beijar durante a missa.


(Imagens retiradas da Internet).


Beijo na cruz e coronavírus

A caridade católica mata velhinhos caridosamente nos lares, contagiando-os com o coronavírus ao darem-lhes a cruz beijar na Páscoa.
Encostando o crucifixo aos lábios quase frios dos moribundos.
Para quê a eutanásia? Basta apanhar o coronavirus na imagem de Cristo, muito beijada e muito babujada. Desinfectada. Reinfetada... Voltada a desinfetar e a reinfetar... Sempre é melhor o martírio do que a eutanásia.

quinta-feira, abril 02, 2020

Boicote? Não, isto é o nosso trabalho normal


Uma minha colega e amiga diz, com razão, que não existe outra profissão em que, enquanto tu estás a tentar trabalhar, há várias pessoas a tentarem ativamente boicotar o teu trabalho. Como se tu estivesses ao computador e houvesse pessoas a desligar o teclado e o rato. Isto é quase o mínimo que os alunos nos fazem. Entretanto temos de reconectar os cabos e reiniciar o computador, no meio de grande algazarra. Se passamos um documentário sobre a poesia de Camões, descobrem que as colunas têm Bluetooth e põem como banda um jogo de futebol. Uma menina mais amorosa diz-nos ao ouvido: - Setôra, desligue o Bluetooth. - Que é isso? E agora os pais, com os filhos a fazerem isto twenty-four-seven, rezam pelo nosso regresso ao trabalho. - Curiosamente, nós também queremos regressar - afirma uma professora nossa conhecida.

quarta-feira, abril 01, 2020

Dilemas da esquerda

Uma coisa que não tem graça nenhuma, enfim, tem alguma graça, não, não tem nenhuma! Enfim, este meu dilema vai continuar...
É esta: entre as grandes vítimas deste enclausuramento, estão os carteiristas e demais ladrões. Roubar carteiras a quem, se não há ninguém nas ruas? Assaltar casas como, se as casas estão cheias de gente?
Restam-lhes, coitados, os serviços sociais e as obras de caridade. Esperemos que não roubem os fundos dessas instituições.
Ser de esquerda tem as suas idiossincrasias, mas também tem estas incoerências…

Ó Cóvide Dezanove!

Se o vírus fosse português, toda a gente, primeiro o Herman José e depois toda agente, fazia pouco do nome dele:

- Ó Cóvide Ronaldo!
- Ó Cóvida Venessa!

Acabava por emigrar pararam terra mais tolerante e simpática. Que culpa tenho eu do nome que me puseram? - Diria.

quinta-feira, março 26, 2020

Matar o Bicho

                                                              

As autoridades aconselham a gargarejar com água morna e sal para matar o bicho e recomendam outras coisas igualmente desagradáveis. A única vez que tentei fazer tal coisa, engasguei-me e expeli um chuveiro de água e sal para todo o espelho da casa de banho. Vocês conseguem? 
Pelo contrário, há uma maneira antiga e muito moderna de matar o bicho: matá-lo com álcool.
Não desespere ao pensar que deve fazer isso com álcool etílico. Até porque não existe tal coisa à venda, neste momento.
Os enólogos portugueses aconselham um copinho de vinho tinto, que, além de álcool, contém poli-nao-sei-o-quê, talvez polifenóis, ou algo assim, totalmente fatais para o bicho.
Se quiser ser mais radical, um pouquinho de nada de Gin puro (o Gin foi inventado como medicamento) ou um whisky puro. 
Não exagere. Uma garrafa inteira, bebida toda de uma vez, mata demasiados bichos, incluindo os bichos bons! 
E às vezes, até mata o bicho principal, ou seja, você.

Você não acreditou? Então, clique neste link e leia.


O novo coronavírus morre no vinho? Enólogos espanhóis respondem

segunda-feira, março 23, 2020

Quantas bolas... de gelado



Havia, no Centro Comercial Amoreiras, uma minúscula gelataria, só com duas mesas coladas uma à outra.
Num fm de tarde de domingo, sentaram-se, ao meu lado, uma mulher obesa com quatro bolas de gelado e cone comestível, com um homem magro, tomando um café expresso.
De repente, ele começou a falar, a criticar, a acusar, a lamentar e quase a chorar. 
Tinha casado com uma mulher magra e elegante. Se não podes resistir a um gelado, não podias ao menos comer só dias bolas de gelado como esta senhora aqui ao lado que nem é gorda? Cada vez estas mais gorda! Cada vez comes mais. É só comidas que engordam, quatro bolas de gelado!!!
A senhora não falava, não respondia, absorta no ato de lamber as quatro bolas, talvez já sem sabor.
Quantas mais conversas desoladas e insípidas, quantas mais bolas lambidas desconsoladamente... 
Que será feito destas duas pessoas, talvez agora, com a quarentena obrigatória por causa do Coronavírus, isoladas e confinadas uma à outra, ela cada vez mais obesa, ele cada vez mais desesperado, cada vez mais magro, muito mais sós do que se estivessem mesmo sós, talvez vivendo numa cave sem janelas e sem sol... 
A solidão pode ser feliz.

sábado, março 21, 2020

Dia da Poesia e início da primavera - Homenagem a Baudelaire




Este tem sido um dos meus poemas preferidos, "Elévation", mas espero que deixe de o ser. Baudelaire leva o seu espírito para fora do mundo, pairando por cima das esferas...
Mas talvez seja melhor deixarmos que o nosso espírito fique neste mundo. Talvez, ou talvez não...

Partilho-o, primeiro em tradução, depois no original.


Elevação

Por cima dos paúis, das montanhas agrestes,
Dos rudes alcantis, das nuvens e do mar,
Muito acima do sol, muito acima do ar,
Para além do confim dos páramos celestes,


Paira o espírito meu com toda a agilidade,
Como um bom nadador, que na água sente gozo,
As penas a agitar, gazil, voluptuoso,
Através das regiões da etérea imensidade.


Eleva o vôo teu longe das montureiras,
Vai-te purificar no éter superior,
E bebe, como um puro e sagrado licor,
A alvinitente luz das límpidas clareiras!


Neste bisonho dai' de mágoas horrorosas,
Em que o fastio e a dor perseguem o mortal,
Feliz de quem puder, numa ascensão ideal,
Atingir as mansões ridentes, luminosas!


De quem, pela manhã, andorinha veloz,
Aos domínios do céu o pensamento erguer,
— Que paire sobre a vida, e saiba compreender
A linguagem da flor e das coisas sem voz!


Charles Baudelaire, in "As Flores do Mal"
Tradução de Delfim Guimarães



Elévation

Au-dessus des étangs, au-dessus des vallées,
Des montagnes, des bois, des nuages, des mers,
Par delà le soleil, par delà les éthers,
Par delà les confins des sphères étoilées,

Mon esprit, tu te meus avec agilité,
Et, comme un bon nageur qui se pâme dans l'onde,
Tu sillonnes gaiement l'immensité profonde
Avec une indicible et mâle volupté.

Envole-toi bien loin de ces miasmes morbides;
Va te purifier dans l'air supérieur,
Et bois, comme une pure et divine liqueur,
Le feu clair qui remplit les espaces limpides.

Derrière les ennuis et les vastes chagrins

Qui chargent de leur poids l'existence brumeuse,
Heureux celui qui peut d'une aile vigoureuse
S'élancer vers les champs lumineux et sereins; 

Celui dont les pensers, comme des alouettes,
Vers les cieux le matin prennent un libre essor,
- Qui plane sur la vie, et comprend sans effort
Le langage des fleurs et des choses muettes!


Charles Baudelaire


(Imagem retirada ad Internet)

segunda-feira, março 16, 2020

Esconjuro contra o Coronavírus


Ó nuvenzinha do ar chove, chove, chove,
Para afogar o bicho do Covid 19.

Santinhos do céu e mais a Santa Luzia, 
Livrai-nos desta porcaria desta pandemia.

Para matar o bicho nem precisamos de arsénico, 
Basta-nos esta modernice do papel higiénico

sexta-feira, março 06, 2020

Theremin



Este instrumento musical toca-se só com a energia das mãos, sem encostar as mãos e o som parece uma voz feminina. 
Chama-se Theremin.

domingo, fevereiro 09, 2020

Racismo e anti-racismo



Quando vivi no Algarve, tive uma amiga muito bonita, muito querida, normalmente inteligente, mas que não tinha a quarta classe, a escolaridade obrigatória na época, teria só a segunda ou terceira. Sentia-se muito inferiorizada perante os amigos e amigas que até tinham o nono ano e que estavam sempre a mostrar que eram muito cultos, falando de coisas de que ela não sabia falar, mas não se sentia mal comigo, à época professora do Liceu António Aleixo. Conversávamos muito na praia pequena ao lado da praia da Rocha, para onde íamos às vezes, ou nos bares circundantes.
Não tinha a quarta classe, porquê? 
Quando vivia em África, muito pequenina, a professora e os colegas batiam-lhe por ser branca. Quando, pouco depois, veio para Portimão, na descolonização, a professora e os colegas batiam-lhe por ser preta. Era mulata.
Perante os atuais antirracistas militantes, que são de esquerda como eu, com quem tenho discutido estes assuntos, a menina só foi vítima de racismo em Portimão. Em Moçambique, ou Angola, não me lembro, era apenas uma perigosa colonialista imperialista.

Esta discussão faz sentido atualmente, com as Joacines e os Mamadus da vida... 
Discutir tudo com a inteligência, com a razão e com a lógica, é necessário.

(Como não havia ainda redes sociais nessa época, perdi o contacto com esta amiga, que foi viver para os Estados Unidos, casada com um americano. Tudo está bem quando acaba em bem!).


Foto: Praia de areia preta, Ilha de Stromboli, Itália. Foto do blogue.

segunda-feira, janeiro 27, 2020

Para quando uma "marselfie" do Marcelo com o Rui Pinto em liberdade?






Heróis do mar: Rui Pinto, ou o que finge tirar um bébé do caixote do lixo, recebendo logo um apartamento em Cascais, enquanto os verdadeiro salvadores, não heróis, claro, continuam a dormir na rua.


Como explicar que o "nosso" Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, dê medalhas e elogios e selfies ao grande "herói" que fingiu resgatar o bebé do caixote do lixo, mas deixe estar na cadeia o Rui Pinto? Será que tem telhados de vidro?

E cá vamos, cantando e rindo, com as Joacines a fazerem-nos pensar e discutir questiúnculas, como  a  importância política da gaguez ou a saia dos assessores. 

Mais uma vez os nossos políticos nos envergonham perante o mundo.

VER E CLICAR AQUI

terça-feira, janeiro 21, 2020

Ironia das ironias, tudo é ironia







Será que os portugueses são assim tão estúpidos? Ou será que os políticos portugueses não são capazes de entender a mudança que ocorre em Portugal e no mundo?
Quando digo políticos portugueses, tanto me refiro ao Marcelo como à Joacine.
Ou aos políticos que sempre lidaram bem com a Isabel dos Santos e o pai, mas que ainda se entendem melhor (ou pior, melhor ou pior é igual) com o atual governo de Angola.
Vocês não acham que esta gente ainda vive no século XX? E que esta gente pensa que nós ainda vivemos no século XIX?


Imagens retiradas da imprensa:
VER



Angola propõe-se a reduzir pobreza extrema a três milhões de pessoas até 2022

sábado, janeiro 18, 2020

A beleza da manhã em Lisboa






A caminho do trabalho, a pé, contemplando a beleza da manhã citadina, o céu como uma tela desenhada pelos jatos, talvez prenunciando múltiplas viagens pelas nuvens. Nefelibatas.

domingo, janeiro 05, 2020

Hoje é o dia em que os Reis Magos chegam ao presépio.









Hoje é o dia em que os Reis Magos chegam ao presépio. 
Mas também existe o antes e o depois. pelo menos na sua representação na arte. O antes é a dormição, em que tiveram o sonho. Na arte medieval, são representados  dormir juntos, maneira prática de representar o sonho comum de todos.
Dormição é também um termo usado para designar a morte que não é morte, como a de Nossa Senhora, ou a de São Francisco de Assis. 
Por outro lado, existe também o depois, ou seja, como regressaram? Aparentemente, também regressaram juntos,a julgar por outro iluminura, esta de 1200.
Interessantes são as representações em iluminuras...


Imagens retiradas da Internet:Imagem 1 _ Iluminura MedievalImagem 2 - Livro de Horas Igreja Católica Liturgia e Ritual, Adoração dos Reis Magos, séc. XV [Biblioteca Nacional de Portugal]Imagem 3 - O sonho dos Três Reis Magos, Mestre Aster Gislebertus, Catedral de Saint Lazare, Autun, FrançaImagem 5: Iluminura Medieval, 1200

sexta-feira, janeiro 03, 2020

Metáfora do País: herói salvador fictício, verdadeiros salvadores na rua e na miséria





Foi criado o cargo de Coordenador Nacional para os Sem-abrigo.
Quem deveria assumir este cargo era aquele que ganhou duas casas e quase ganhava um medalha do presidente Marcelo: o "herói" que (alegadamente) salvou o bébé do lixo. 

Porquê herói? Correu algum perigo?
Descobriu-se depois que não teve nada a ver com o bébé, mas nessa altura já morava na sua casa de Cascais, enquanto os verdadeiros salvadores continuavam na rua, sem-abrigo e sem medalhas.
Claro, onde iriam meter as medalhas, se nem casa têm??? para que precisariam de medalhas?
Isto é uma perfeita metáfora do país em que vivemos: não importa ser, importa parecer.
Mas, como diz José Gil, No seu maravilhoso livro sobre os mitos portugueses *, somos peritos em fabricar não-acontecimentos. Este caso, ou melhor, o esclarecimento deste caso,  foi um não-acontecimento. 

Não aconteceu. Ouviram???

* Livro: Portugal Hoje: o medo de existir.
Imagem: mapa do Google.

quinta-feira, janeiro 02, 2020

Bento XVI - Papa revolucionário



Gosto muito deste Papa, que nasceu no mesmo di aqui eu (16 de abril). E que deu lugar ao Papa Francisco, uma jóia do nosso tempo.
Gosto dele por esta afirmação, ente outras:


«O homem tem mais medo do poder da opinião pública do que da luz distante e indefesa da verdade. Ele curva-se ao poder da opinião, tornando-se seu aliado, um de seus portadores. Torna-se escravo da aparência. Nas suas acções ele já não se orienta de acordo com a realidade, mas de acordo com as reacções dos outros.

Deste modo, chegamos ao domínio de opinião, ao domínio do falso. E assim, toda a vida de uma sociedade - decisões políticas e pessoais - baseiam-se na ditadura do falso.»

Joseph Ratzinger / Papa Bento XVI
Roma, Quarta-Feira de Cinzas de 1989
VL

domingo, dezembro 22, 2019

As ovelhinhas do presépio



No tempo em que eu andava na segunda classe da escola primária (e também na terceira e quarta), tive uma professora muito religiosa, muito antiquada e que na altura parecia muito velha, por contraste com a rapariga que me deu a primeira classe e da qual eu também não gostava nada. Muito mimada em casa, odiava a escola e ainda hoje me arrepio ao recordar tudo isto. Mal sabe que iria passar toda a vida, ou pelo menos até agora, num ambiente de professores e alunos, tornado, felizmente, mais fraterno.

No Natal desse segundo ano, as professoras, lideradas pela minha, fizeram um enorme presépio no átrio da escola, em que havia uma ovelhinha para cada menina, cada uma de nós. Na nossa sala, havia também uma grande cruz em papel quadriculado, com várias linhas para cada uma, dependendo da parte mais larga ou mais estreita da cruz. Nas linhas deveríamos inscrever um sacrifício, um cruz em vermelho, ou uma abstenção, um cruz em verde. As nossas velhinhas, colocadas ao fundo do monte, dariam um pequeno passo por cada abstenção e um grande salto por cada sacrifício. Giríssimo, como diriam agora os pedagogos!

Muito antes do último dia de aulas, já as minhas linhas estavam a  abarrotar de cruzes vermelhas e a  minha ovelhinha estava quase enfiada em cima da manjedoura. Tudo medido ao milímetro, para não me chatearem depois.

No último dia, foi realizada uma pequena cerimónia e as professoras chamaram-me ao cimo da escadaria para me perguntarem que sacrifícios, tantos e tão grandes, tinha eu feito, para servir de exemplo às minhas pouco sacrificiais colegas (de quem eu também não gostava, claro). E sendo eu também a melhor aluna, etc...

Respondi, muito naturalmente, que era para mim um grande sacrifício levantar-me todos os dias da cama e ir para as aulas e que, todo os dias, a minha velhinha dava um grande salto, com tamanho sacrifício. Mal me ouviram dizer isto, as minhas colegas foram logo  procurar as respetivas ovelhas, que ainda se encontravam no sopé do musgo, para as enfiarem dentro do estábulo, ou à volta se já não cabiam dentro, embora as professoras tentassem evitar, sem conseguirem encontrar argumentos, nem atitudes válidas... afinal, eu era a melhor aluna. E também era a aluna que fazia mais sacrifícios e abstinências... 

Um exemplo vivo, ali, a discursar ao cimo das escadas. Muito contrariada.

sábado, dezembro 21, 2019

Solstício de Inverno




Brindemos ao solstício. Que sejamos capazes de merecer o inverno, tal como julgamos merecer o verão. 
Que sejamos capazes de sentir os prazeres do recolhimento, ou dentro das casas por onde passamos, ou dentro dos nossos corações.

sábado, dezembro 14, 2019

Inseto Flower Mantis, ou a beleza da mentira











Inseto muito belo, com camuflagem de flores, Flower Mantis, espécie de louva-a-deus. 
Finge que é uma flor, para apanhar outros insetos e comê-los, chamar-lhes um figo!
Bela, hipócrita e má! Ou será belo, hipócrita e mau? Parece que isto fica melhor no feminino...
Os louva-a-deus até comem pássaros, aranhas, cobras, gafanhotos e lagartos.

Mas estes inscrevem-se na inominável beleza do mundo.

(Fotos da Internet).